Os Artigos federalistas

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Artigo 1

Ao Povo de Nova York

                Após a inequívoca constatação da ineficiência do governo federal, vocês são chamados a deliberar a respeito de uma nova Constituição para os Estados Unidos da América. É óbvia a importância do assunto, pois ele traz como consequências nada menos do que a existência da União, a segurança e bem-estar das partes que a compõem, o destino de uma nação que em muitos sentidos é a mais interessante do mundo. Tem-se notado com frequência que parece caber ao povo deste país, por sua conduta e exemplo, decidir acerca de uma importante questão –  se as sociedades dos homens são realmente capazes de instaurar um bom governo, por meio de reflexão ou de escolha, ou estão eternamente fadadas a depender de sua estrutura política ou por acaso ou por imposição. Se houver alguma verdade nessa observação, a crise à qual chegamos pode, com propriedade, ser vista como ocasião para essa decisão seja tomada; e por essa linha de raciocínio, uma escolha equivocada do papel que devemos desempenhar merece ser considerada o grande infortúnio da humanidade (Os Artigos Federalistas).

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                Essa ideia acrescentará incentivo filantrópico à motivação patriótica, para intensificar o anseio que todos os homens bons e justos devem sentir em virtude das circunstâncias. Será ótimo se pudermos guiar nossa escolha por uma avaliação ponderada dos nossos reais interesses, uma avaliação livre de dúvida e isenta de considerações que não estejam vinculadas ao bem público. Mas isso é algo que desejamos ardentemente, porém não podemos esperar seriamente. O plano submetido a nossa deliberação afeta muitos interesses particulares impõe mudanças a um grande número de instituições locais – portanto, sua discussão envolve necessariamente diversos assuntos alheios a sua importância, bem como diversas opiniões, paixões e preconceitos que pouco favorecem a descoberta da verdade.

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                Entre os mais duros obstáculos com os quais a nova Constituição terá que deparar, podemos distinguir prontamente o óbvio interesse de uma certa classe de homens em todos os Estados em resistir a todas as mudanças que possam significar uma diminuição de poderes remuneração e importância dos cargos que detém nas instituições do Estado; e também a ambição depravada de outra classe homens que desejaram se locupletar  à custa da confusão instalada em seu país, ou se iludiram com possibilidades mais sedutoras de ascensão no cenário de subdivisão da nação em diversas confederações parciais do que num cenário de sua união sob um único governo.

                Eu não tenho, contudo, o propósito de discorrer a respeito de considerações dessa natureza. Estou bem consciente de que seria desonesto reduzir indiscriminadamente a oposição de qualquer grupo de homens (apenas porque sua situação despertar suspeitas) a opiniões tendenciosas ou ambiciosas. A lealdade nos obriga a admitir que até mesmo esses homens podem ser movidos por intenções justas; e não resta dúvidas que grande parte da oposição que foi externada, ou ainda poderá ser externada, surgirá de fontes no mínimo inocentes, se não respeitáveis – os erros honestos mentes que se deixaram desencaminhar por ciúme e receios preconcebidos. Com efeito, são tão numerosas e tão poderosas as razões que contribuem para distorcer o julgamento que em muitas ocasiões vemos homens sábios e bons se posicionarem do lado correto tanto quanto do lado errado no que toca a questões de primordial importância para a sociedade. Essa circunstância, se devidamente levada em conta, forneceria uma lição de moderação às pessoas que se convenceram de que estão sempre certas em qualquer controvérsia. E um motivo adicional de cautela a respeito disso pode advir da reflexão de que nós nem sempre sabemos com certeza se aqueles que falam em nome da verdade são influenciados por princípios mais puros que de seus antagonistas. Ambição, avareza, animosidade pessoal, oposição partidária e vários outros motivos não mais louváveis que os primeiros podem influenciar tanto aqueles que apoiam quanto aqueles que se opõem ao lado certo de uma questão. Mesmo que tais incentivos para a moderação não existissem, nada poderia mais inconsequente do que o espirito intolerante que sempre caracterizou os partidos políticos. Porque no campo da política, bem como no da religião, é igualmente absurdo querer conquistar adeptos a qualquer custo. Em ambos os casos, raramente a perseguição é a melhor maneira para se lidar com heresias.

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                Contudo, por mais que sejam justos esses sentimentos, já existem indicações suficientes de que as coisas ocorrerão dessa vez do mesmo modo que ocorreram em todos os casos anteriores de grande repercussão nacional. Uma torrente de paixões raivosas e malignas será desencadeada. A julgar pela conduta dos partidos adversários, somos levados a concluir que eles buscarão, de um só golpe, expor a precisão de suas opiniões e aumentar o número de seus adeptos por meio da intensidade de seus discursos e pela ferocidade de suas acusações. Um empenho consciente por um governo dotado de autoridade e eficiência será estigmatizado como produto de uma mente simpática ao poder despótico e hostil aos princípios de liberdade. Um temor excessivo de que os direitos das pessoas estejam em risco, que costuma ser uma falha mais ligada à mente do que ao coração, terá lugar como mero pretexto e artifício; um conhecido engodo para se obter popularidade à custa do bem público. Por um lado, não se levará em conta que o ciúme está associado ao amor, e que o nobre entusiasmo por liberdade está sujeito a ser infectado por um espírito de desconfiança tacanho e intolerante. Por outro lado, também não se levará em conta que a autoridade do governo é essencial para a segurança da liberdade; que numa avaliação judiciosa e bem fundamentada, os interesses de ambos jamais devem ser separados; e que uma ambição perigosa se esconde por trás da máscara enganosa do zelo pelos direitos do povo mais frequentemente do que sob a forma estigmatizada de firmeza e eficiência do governo. A história nos ensina que a primeira se mostrou um caminho muito mais garantido para a introdução do despotismo do que a última, e nos ensina também que, dos homens que destruíram as liberdades de repúblicas, a maioria iniciou suas carreiras cortejando de maneira servil o povo: eles começaram como demagogos e terminaram como tiranos.

                No curso das observações anteriores eu busquei alertá-los, meus compatriotas, para que se resguardem contra todas as tentativas – venham elas de onde vierem – de influenciar, por meio de qualquer ideia que não resulte da evidência da verdade, sua decisão em uma matéria de extrema importância para o próprio bem-estar. Ao mesmo tempo, vocês sem dúvida perceberam, a partir do escopo geral dessas observações, que elas provêm de uma fonte que não é hostil à nova Constituição. Sim, meus compatriotas, eu reconheço que depois de dedicar a ela uma cuidadosa atenção, cheguei à conclusão de que é do interesse de vocês adotá-la. Estou convencido de que este é o caminho mais seguro para sua liberdade, sua dignidade e sua felicidade. Eu não simulo restrições que não sinto ter. Não vou desperdiçar o tempo de vocês fingindo ter dúvidas e deliberando acerca de algo que já decidi. Admito-lhes francamente minhas convicções, e lhes exporei voluntariamente as razões que fundamentam. A consciência das boas intenções despreza a ambiguidade. Contudo, não devo estender-me em declarações nesta introdução. Meus motivos devem permanecer guardados comigo. Meus argumentos estarão abertos a todos, e todos poderão julgá-los. Eles devem pelo menos ser oferecidos com um propósito que não desonre a causa da verdade.

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                Proponho, numa série de artigos, os importantes temas que se seguem:

  • A utilidade da União para a prosperidade política;
  • A ineficiência da Confederação atual para preservar essa União;
  • A necessidade de um governo pelo menos tão enérgico quanto o proposto, para que esse objetivo seja alcançado;
  • A concordância da Constituição proposta com os verdadeiros princípios do governo republicano;
  • Sua afinidade com as constituições estaduais;
  • A segurança adicional que sua adoção representará para a preservação desse tipo de governo, para a liberdade e para a prosperidade.

No decorrer desse debate, buscarei responder de maneira satisfatória a todas as objeções que que possam surgir e que tenham de algum modo chamado a atenção de vocês.

Pode parecer supérfluo apresentar argumentos para provar a utilidade da União, um tema que decerto está profundamente gravado nos corações das pessoas em cada um dos Estados – um tema que em tese não tem adversários. Mas o fato é que já ouvimos sussurrarem, nos círculos privados daqueles que se opõem à nova Constituição, que os 13 Estados são extensos demais para qualquer sistema geral, e que será necessário recorrer a confederações separadas de porções distintas do todo. Muito provavelmente essa doutrina se propagará gradualmente, até conquistar simpatizantes em número suficiente para que seja abertamente ratificada. Porque para aqueles que são capazes de enxergar a situação de modo mais abrangente é bastante evidente que se a nova Constituição não for adotada ocorrerá o desmembramento da União. Portanto, será útil começar examinando as vantagens dessa União, os males inegáveis e os prováveis perigos aos quais cada Estado será exposto caso ocorra sua dissolução. Dessa maneira, esse será o assunto que abordarei em meu próximo artigo.

                                                                                                                              Dr. HAMILTON

  • Os Artigos Federalistas são uma coleção de 85 ensaios escritos por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay durante o final de 1787 e o início de 1788. Originalmente publicados em jornais de Nova York para promover a ratificação da Constituição dos Estados Unidos, esses ensaios abordam questões fundamentais sobre o funcionamento do governo federal proposto e os princípios da república democrática. Os Federalistas oferecem uma defesa eloquente da necessidade de um governo central forte, argumentando que isso garantiria a estabilidade política, a segurança nacional e a prosperidade econômica. Esses escritos continuam sendo uma fonte influente para a compreensão do pensamento político dos pais fundadores dos Estados Unidos e das estruturas institucionais do governo americano.
  • Artigo copiado integralmente da Obra Os Artigos Federalistas – Ed. Avis Rara

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José P Maciel é Economista, Pós-graduado em Gestão de Projetos do Setor Público. Pesquisador nas áreas de Filosofia e literatura.

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